09 julho 2009

A autarquia só precisa de não estorvar!

S. João da Madeira é um concelho com características únicas no contexto dos 308 municípios portugueses. Conta com um território físico de pequena dimensão, uma única freguesia e uma população residente que vai pouco mais além das 21 mil pessoas. Infra-estruturas básicas como a rede viária, saneamento, abastecimento de água, redes eléctrica, de gás ou de telecomunicações cobrem, praticamente, todo o concelho. Por outro lado, conta com um dinamismo empresarial que se destaca na Região e no país, constituindo um factor de forte atracção de muita gente de concelhos vizinhos que cá trabalha. O nível de serviços disponíveis também está acima da média do país, o comércio é diversificado e, de uma forma geral, de qualidade. As nossas escolas são boas, contam com excelentes profissionais e com várias ofertas educativas e organizam actividades importantes que envolvem toda a comunidade. O movimento associativo em S. João da Madeira é também bastante dinâmico e as nossas colectividades têm mostrado, ao longo do tempo, energia e resultados bastante interessantes nas mais diversas áreas. Instituições como a Santa Casa da Misericórdia ou os Bombeiros Voluntários, existentes também em grande parte dos concelhos portugueses, em S. João da Madeira são reconhecidas e respeitadas pelo trabalho intenso que desenvolvem em prol de toda a comunidade.

Mas repare-se que tudo o que referi no parágrafo anterior é algo que caracteriza S. João da Madeira há já largos anos, não é de agora. É algo que já damos por adquirido há muito tempo, já faz parte da matriz genética do nosso concelho. São aspectos, aliás, decisivos para que nos fôssemos afirmando em toda esta Região do Entre Douro e Vouga, no Distrito de Aveiro e também no país. Mas, afinal, o que falta a S. João da Madeira?

Certamente que esta pergunta terá respostas abrangentes e diversas por parte das várias forças políticas, partidárias ou independentes, que concorrerão às próximas eleições autárquicas. No entanto, pelo menos olhando para aquilo que foram os últimos anos da gestão do nosso concelho, não tenho grandes dúvidas em dizer que tem faltado pelo menos uma coisa: sensibilidade social. Na área social, não tenho dúvida alguma que ainda há muito para fazer e, para que tal aconteça, falta, de facto, o mais importante: sensibilidade.

Eu sou dos que defendem que as questões sociais, inclusivamente ao nível da definição das intervenções, não são assuntos apenas da autarquia. A autarquia é uma peça importante e imprescindível, é certo! No entanto, as entidades que estão no terreno deverão ter margem de manobra e recursos suficientes para levarem por diante as intervenções concretas que se mostrem necessárias, de forma articulada, rigorosa, eficaz e transparente. E aqui o trabalho em rede e em parceria, o trabalho da Rede Social que existe em S. João da Madeira, pode fazer toda a diferença. A reduzida dimensão do nosso concelho e o grande dinamismo e competência das instituições que se sentam na nossa Rede Social são condições que nos fazem ter confiança de que é possível fazer muito mais e melhor. Para tal, só falta mesmo a tal sensibilidade da nossa autarquia para as questões sociais, que é quem preside à Rede Social e quem pode servir de âncora para a captação de investimentos importantes para infra-estruturas e desenvolvimento de projectos fortes e relevantes. A pobreza, as dificuldades associadas a fenómenos como o desemprego, a toxicodependência, a violência doméstica, o alcoolismo, o abandono escolar, a deficiência, as dificuldades vividas pelos idosos e respectivas famílias que não encontram no concelho as respostas suficientes, o abandono e a exclusão são, infelizmente, alguns dos problemas que afectam também o nosso concelho. A falta de sensibilidade para com estes problemas é o primeiro passo para que se desviem os recursos disponíveis para outras prioridades que não aquelas que nos deviam mover a todos: a dignificação da pessoa humana, o combate às injustiças e às desigualdades e a atenção redobrada para com os mais desfavorecidos e os mais vulneráveis.

Creio, portanto, que a autarquia não se deve comportar como um obstáculo ao desenvolvimento de acções e intervenções concretas que possam eliminar ou atenuar determinados problemas. Para tal, se dúvidas houver, bastará olhar para a lei que regula a constituição e o funcionamento das Redes Sociais onde se refere, por exemplo, que:

“A rede social pretende constituir um novo tipo de parceria entre entidades públicas e privadas, actuando nos mesmos territórios, baseada na igualdade entre os parceiros, no respeito pelo conhecimento, pela identidade, potencialidades e valores intrínsecos de cada um, na partilha, na participação e na colaboração, com vista à consensualização de objectivos, à concertação das acções desenvolvidas pelos diferentes agentes locais e à optimização dos recursos endógenos e exógenos ao território.” (in Decreto-Lei nº 115/2006, de 14 de Junho)

No momento em que percebermos isto e estivermos conscientes dos nossos recursos, das nossas necessidades e da qualidade das nossas instituições que estão no terreno, estarão reunidas as condições para o desenvolvimento de um trabalho diferente e com maior impacto no que verdadeiramente interessa. A autarquia, nessa altura, só precisa de não estorvar!

Arigo publicado no Jornal Labor.

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