18 novembro 2010

Entre_linhas 105 (18novembro2010)

Na semana passada, a TSF noticiava que os riscos de propagação da cólera no Haiti se tinham multiplicado com a passagem do furacão Tomas. O balanço das autoridades sanitárias apontava para mais de 540 mortos provocados pela epidemia de cólera, sendo que mais de oito mil pessoas tinham sido já hospitalizadas. Entretanto, tinha surgido a notícia do primeiro caso suspeito detectado na capital do Haiti, em Port-au-Prince, pelo que, uma portuguesa, Mariana Palavra, que integra a missão de paz da ONU no Haiti, dava conta em directo das operações de sensibilização que se verificam no terreno. Esta portuguesa, por coincidência, é minha “amiga” no Facebook. Como achei muito importante o seu depoimento, ainda por cima numa altura em que está bastante fresca a emoção da minha recente experiência na Guiné-Bissau, resolvi pedir à Mariana um parágrafo exclusivo para os meus leitores n’ O Regional, com uma descrição muito pessoal da realidade vivida hoje na capital do Haiti. Confesso que a Mariana me surpreendeu quando aceitou o desafio e, por isso, cá vos deixo aquilo que ela me mandou:

«No momento em que escrevo, o Haiti vive um dos momentos mais quentes dos últimos meses. Manifestações na rua, confrontos com a polícia e com os capacetes azuis, um ataque ao governo e à ONU. É sobretudo o surto da doença que põe os manifestantes em cólera, acusando as autoridades de nada fazer e as Nações Unidas de terem trazido a bactéria para o país. Mas, na verdade, há outras razões para o descontentamento: a lenta reconstrução do país, a existência de mais de mil campos de deslocados sem um mínimo de condições, 1,3 milhões de desalojados. Dez meses depois do terramoto, o Haiti prepara-se para multiplas eleições, nomedamente presidenciais. Mas, para além da violenta campanha eleitoral, das manifestações diárias e do surto de cólera (que já fez mais de 1000 mortos em menos de um mês), pouco ou nada mudou desde aquele dia 12 de Janeiro de 2010.»

Esta atitude da Mariana, acreditem, não é comum. Já não chegava a coragem e a disponibilidade de servir a ONU num país com graves problemas, para agora se disponibilizar para partilhar com os leitores de um jornal local, em Portugal, este pequeno mas importantíssimo parágrafo. Embora seja apenas um parágrafo, para mim vale do que 1000 peças jornalísticas produzidas nas redacções em Portugal. Podem acompanhar o dia-a-dia da Mariana Palavra em http://pontofinalmacau.wordpress.com

O acto de noticiar anda pelas ruas da amargura. Há coisas que aparecem nos jornais que não passam de meras especulações e são baseadas, muitas vezes, em pressuposto no mínimo discutíveis. Há jornalistas (e não falo de autores de artigos de opinião, claro está) que estão mesmo a ultrapassar todos os limites do razoável, chegando mesmo a ser ridículos, tal é a necessidade de estimularem a intriga e o “diz que disse”. Por exemplo, o semanário SOL da semana passada trazia uma peça que começava assim: “O ambiente nos gabinetes governamentais está cada vez mais «parecido com o de um fim de ciclo», garante ao SOL o adjunto de um ministro.” Ora, fazer uma notícia com base na garantia de um “adjunto de um ministro” sem dizer o seu nome parece-me excessivo! E para que conste, eu sou assessor de um Secretário de Estado e digo desde já que tanto eu como os meus colegas estamos muito motivado em fazer andar o país para a frente! Se alguém conhecer a jornalista em causa, por favor faça-lhe chegar este depoimento. Espero que o SOL faça dele uma notícia pelo menos com o mesmo destaque! E mais: não precisa o SOL de dizer “um assessor de um Secretário de Estado”. Pode mesmo dizer o meu nome que eu não me importo! A fonte pode, portanto, ser revelada a bem da credibilidade da notícia!

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